Doença de Whipple: um relato de caso
Resumo
A Doença de Whipple é definida por uma manifestação multissistêmica, rara, relacionada ao Tropheryma whipplei, um bacilo Gram positivo intracelular obrigatório. (CARNEIRO et al, 2004). Com uma prevalência de 3:1.000.000, os pacientes com essa doença são predominantemente homens (6:1), com aproximadamente 50 anos e caucasianos (BURES et al, 2013). Tratam-se de raros casos pois os acometidos possuem uma deficiência na imunidade celular, principalmente relacionado aos linfócitos CD11b e à presença do HLA B27 (SILVA et al, 2017). O curso da moléstia é lento e inicia-se de forma inespecífica, geralmente cursando com febre e poliartralgia. Com a evolução, que pode demorar cerca de 6 anos, aparecem sintomas gastrointestinais, como dor abdominal, emagrecimento e diarreia crônica, além de outros sintomas gerais como perda ponderal, linfadenomegalia, alterações neurológicas, cardiovasculares e pulmonares. O quadro laboratorial pode indicar anemia, leucocitose, aumento de reagentes de fase aguda e alterações de má absorção (ROCHA et al, 2015). Por ser uma síndrome rara e de sintomas inespecíficos, o diagnóstico geralmente é demorado visto que não é o primeiro palpite dos profissionais. Entretanto, para investigar a Doença de Whipple é necessária uma biópsia duodenal juntamente com coloração PAS ou reação da cadeia de polimerase para T. whipplei (GÜNTHER et al, 2015). O tratamento, por fim, é a antibioticoterapia, iniciando com o uso de Ceftriaxona 2g/dia, por 2 semanas, e posteriormente Sulfametoxazol e Trimetoprima, por no mínimo 1 ano (BURES et al, 2013). Dessa forma, este trabalho tem como objetivo relatar um caso de Doença de Whipple, comorbidade rara, assistida pelo Hospital Universitário de Londrina (HU). Paciente J.D., sexo masculino, 76 anos, procurou atendimento no HU, no dia 07/02/2022, com queixa de diarreia crônica, associada a vômitos, adinamia e lipotímia. Afirmava fezes de aspecto líquido, 5 a 6 vezes ao dia, e emagrecimento de 14 kg. Como comorbidades, apresentava doença renal crônica, com possível agudização ao buscar o serviço, e pancreatite crônica de provável etiologia alcoólica em investigação no Hospital das Clínicas. Ao exame físico, apresentava-se em regular estado geral, levemente descorado e afebril, sem demais alterações aparentes, a não ser pelo aspecto globoso do abdome, no entanto sem sinais de alarme. Em internação prévia, foi constatado paniculite por tomografia e biópsia sugestiva de colite, com vilosidades achatadas em duodeno, aumento de linfócitos intra-epiteliais e aumento de macrófagos em córion. Foi então admitido no hospital, com exames laboratoriais indicando quadro séptico, sendo tratado com antibioticoterapia devido às provas inflamatórias elevadas. Para além disso, os exames apontavam anemia normocítica e normocrômica, leucocitose com aumento de segmentados, PCR significativamente aumentado e queda de albumina. Após diversas abordagens para estabilização do paciente e longa investigação, foi suspeitado Doença de Whipple e solicitada uma revisão da lâmina da biópsia de duodeno com coloração PAS, na qual foram identificados macrófagos espumosos corados na lâmina própria, confirmando T. whipplei. Iniciou-se, então, o tratamento com Sulfametoxazol e Trimetoprima e no dia 05/03/2022, diante do bom estado do paciente, foi possível conceder alta. A partir de então, paciente segue em acompanhamento ambulatorial, permanecendo em uso do antibiótico, com significativa melhora clínica e laboratorial. Por se tratar de uma moléstia rara e de quadro clínico inespecífico, a Doença de Whipple é de difícil diagnóstico. Como exemplo do caso aqui relatado, o paciente precisou passar por duas longas internações para que fosse descoberta a sua condição. Nesse caso, apesar da dificuldade, o quadro foi manejado adequadamente, contribuindo para a melhora da qualidade de vida. Porém, casos não identificados ou tratados incorretamente são potencialmente fatais. Diante disso, este é um caso raro que se faz necessário relato para compreensão profissional, com o fim de ser lembrado diante de pacientes que padecem com diarreia crônica inexplicada.