ANÁLISE DO USO DE ATROPINA EM PACIENTES ATENDIDOS POR UM CENTRO DE INFORMAÇÃO E ASSISTÊNCIA TOXICOLÓGICA (CIATox) - 2023
Resumo
A atropina, proveniente da planta Atropa beladona, é um éster alcaloide formado pela combinação de ácido trópico e de tropina, uma base orgânica complexa¹. É utilizada como antagonista competitivo em intoxicações por agentes anticolinesterásicos, como inseticidas agrícolas organofosforados e carbamatos, que provocam acúmulo de acetilcolina na fenda sináptica. Ao bloquear receptores muscarínicos, de forma reversível, a atropina contribui para a reversão dos efeitos colinomiméticos, embora não reestabeleça a função enzimática da acetilcolina². Os Centros de Informação e Assistência Toxicológica (CIAToxs) contraindicam o uso profilático de atropina, sendo reservada em casos de manifestações colinérgicas, como sudorese, miose e bradicardia. A despeito dos protocolos adotados pelos CIAToxs, a atropina é administrada de forma indevida por alguns profissionais. Assim, o presente estudo tem como objetivo analisar os casos de administração de atropina e o uso de seu protocolo, visando identificar a ocorrência e a frequência de administração correta da substância pelos serviços de saúde. Realizou-se um estudo transversal por meio da análise de prontuários de 50 pacientes atendidos por um Centro de Informação e Assistência em Toxicologia (CIATox), ocorridos no ano de 2023, estabelecendo-se como critérios norteadores da investigação (1) o uso de agrotóxicos e produtos de uso veterinário de forma acidental ou em tentativa de autoextermínio e (2) a necessidade de administração de atropina. Os dados foram dispostos em uma planilha no programa Microsoft Excel e analisados com uso deste mesmo software. O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CAAE 45986415.1.0000.5231). Os principais grupos de agentes utilizados foram os agrotóxicos, com uma frequência de 33,3% (Gráfico 1), sendo os raticidas clandestinos a classe mais frequente (45,5%). A principal circunstância de ingestão foi por tentativa de suicídio (75,0%) e observou-se um desfecho final de 8,3% de óbitos relacionados ao evento de intoxicação. Os principais sintomas associados foram alterações nos sinais vitais (19%), sialorreia (18%), alteração no nível de consciência (14%) e miose (14%). Quanto à administração de atropina, em 64,5% dos casos houve administração prévia do medicamento, sem a orientação do CIATox e em 90,0% destes casos a administração ocorreu sem seguir o protocolo preconizado, tendo como principal conduta errônea a não manutenção da atropina em bomba de infusão contínua (50%) (Gráfico 2). Após a orientação do CIATox, em 45,2% dos casos realizou-se a administração do protocolo incorretamente, tendo como maior erro de manejo a descontinuação do protocolo orientado (22,6%) (Gráfico 3). Dentre os casos que obtiveram um desfecho final relacionado a óbito, em 50% ocorreu a incorreta administração do protocolo, seja previamente ou após orientação do CIATox. Baseando-se na análise dos dados, entende-se que na maioria dos casos em que foi iniciado o uso da atropina, os pacientes apresentavam os sintomas critérios para início do protocolo, mostrando que há uma boa taxa de identificação da presença de envenenamento por inibidores de colinesterase pelos médicos. Porém, em grande parte dos casos, houve o início precoce do antagonista, sem consulta com o CIATox e sem seguir o correto protocolo preconizado. Dessa forma, conclui-se que a orientação especializada é de grande importância, visto que, ocorre a diminuição dos erros em seguimento de protocolo após o acompanhamento toxicológico especializado, resultando na diminuição do desperdício de recursos, na melhora do tratamento e na redução de óbitos.